Peterhof – a versão do czar Pedro I, o Grande, para o Palácio de Versailles

Dando um tempo nos posts sobre São Petersburgo (que ainda não acabaram) resolvi escrever um pouco sobre a day trip que fizemos para o palácio construído pelo czar Pedro I, o Grande, nos arredores de sua capital imperial, o chamado Palácio de Peterhof (Петерго́ф) ou de Petrodvorets (Петродворец).

Anos antes de sonhar com a possibilidade de concretizar uma viagem à Rússia, nas minhas “andanças” pela internet, sempre via fotos desse palácio e ficava entusiasmado. Quem me conhece, sabe que eu tenho como hobby a História do século XVIII, sobretudo na França (além de um interesse por qualquer coisa relacionada ao Império Otomano e à Turquia), então, conhecer os palácios de São Petersburgo e de seus environs (principalmente o Peterhof e o Palácio de Catarina) viraram praticamente um objetivo de vida.

Eu sempre digo que gostaria de ter nascido no século XVIII. Óbvio que o ideal seria ter pertencido à nobreza, mas juro que, pelo menos em tese, não me incomodaria de ser um valete ou até mesmo o empregado que esvaziava as águas sujas de algum nobre não falido na corte na França (na Rússia, tenho minhas dúvidas, por conta do inverno horroroso, mas posso mudar de ideia), mesmo que tivesse perdido a minha cabeça durante “la terreur”.

Sonhos se realizam, ainda bem! Só que eu arrumei mais uma fonte inesgotável de interesses: estudar o século XVIII na Rússia. O que gera um problema, pois as nossas livrarias são escassas nos títulos e nem tudo dá para estudar em biblioteca, até porque as melhores só permitem consultas in loco.

Peterhof - Jardim Inferior - Grande Cascata

Peterhof – Palácio Principal – Jardim Inferior – Grande Cascata

Peterhof - Jardim Inferior - Grande Cascata

Peterhof – Palácio Principal – Jardim Inferior – Grande Cascata – Fonte do Sansão

Peterhof - Palácio Principal

Peterhof – Palácio Principal

Senta, que lá vem a história… A construção de Peterhof remonta ao ano de 1714, quando o Imperador Pedro I, o Grande, entendeu por bem mandar edificar uma residência de verão, compatível com a nova capital do Império Russo. Assim como São Petersburgo, a grande inspiração para o palácio foi o mar e a admiração que o Imperador possuía pela Marinha, oriunda dos tempos em que passou na Holanda.

Um dos motivos que levaram o czar a escolher o local para a construção da cidade de São Petersburgo foi a sua proximidade com o Golfo da Finlândia, transformando-a num porto acessível durante todo o ano, mesmo nos meses de rigoroso inverno, já que o Mar Báltico não congela durante o frio.

De mais a mais, em frente a São Petersburgo existe a ilha de Kronstadt, onde o czar mandou construir uma fortaleza para a defesa da cidade. O local em que se encontra o Palácio de Peterhof era utilizado pelo Imperador como um relais, uma parada de descanso, quando ele ia visitar os canteiros de obra de Kronstadt. Encantado com o terreno, ele resolveu mandar construir a sua “casa de veraneio”. Veja-se, então, que Peterhof, um dia, foi uma espécie de Iguabinha ou de Praia Grande para a corte imperial… rsrsrsrsrsrs.

Brincadeiras à parte, o primeiro castelo construído foi o de Monplaisir, justamente à beira do Golfo da Finlândia. Este “castelo”, vamos assim dizer, pois não é enorme e é constituído de um andar só, foi edificado no estilo holandês segundo esboços desenhados pelo próprio Pedro, I, o Grande. Aparentemente, o prédio não tem aquecimento, então ele só abre no verão. É o “sobradinho” que vemos ao fundo na foto abaixo. Em seus jardins, se encontram a Fonte do Sol e a Fonte “O Feixe” (fotos abaixo):

Castelo de Monplaisir - vista do jardim - Peterhof

Castelo de Monplaisir – vista do jardim – Peterhof

Fonte do Sol - Castelo de Monplaisir - Peterhof

Fonte do Sol – Castelo de Monplaisir – Peterhof

Fonte "O Feixe" - Castelo de Monplaisir - Peterhof

Fonte “O Feixe” – Castelo de Monplaisir – Peterhof

Um dos objetivos do czar com a edificação desta residência palaciana era a de competir com o Palácio de Versailles em termos de grandeza e de beleza, tanto, que houve um investimento maciço na decoração dos jardins e das fontes que o guarnecem, além do uso de materiais dourados à folha de ouro. Houve sucesso do Imperador em rivalizar com Versailles em relação à beleza. Realmente, neste quesito, Peterhof, não fica devendo em nada ao magnífico palais do Louis XIV! Contudo, a residência czarista perde em tamanho para o seu rival francês, até porque o magnífico castelo nos arredores de Paris, se não me engano, é a maior residência real da Europa.

Os arquitetos encarregados da edificação do palácio foram Johann Braunstein, Jean-Baptiste Le Blond e Niccolo Michetti, que utilizaram desenhos e rascunhos de autoria do próprio czar.

Peterhof - Jardim Inferior - Grande Canteiro

Peterhof – Jardim Inferior – Fonte do Sansão

Canal Marítimo - Palácio Principal (ao fundo) - Peterhof

Canal Marítimo – Palácio Principal (ao fundo) – Peterhof

Peterhof - Vista do Palácio Principal - para a Fonte de Sansão e o Canal Marítimo

Peterhof – Vista do Palácio Principal para a Fonte de Sansão e o Canal Marítimo

Escultura lateral - Fonte do Sansão - Jardim Inferior - Peterhof

Escultura lateral – Fonte do Sansão – Jardim Inferior – Peterhof

Fonte de Sansão - Vista lateral - Peterhof

Fonte de Sansão – Vista lateral – Peterhof

Peterhof Palácio Principal - Jardim Inferior - Grande Cascata

Peterhof Palácio Principal – Jardim Inferior – Grande Cascata

Um dado interessante que a guia nos relatou, foi que as esculturas que guarnecem a Grande Cascata e a Fonte de Sansão foram originalmente feitas de madeira pintada à folha de ouro. Obviamente que a utilização da madeira, por mais barata que fosse, não deu muito certo… Posteriormente, as esculturas foram confeccionadas em bronze e novamente pintadas à la feuille d’or.

Outra curiosidade diz respeito ao funcionamento das fontes. Vocês se lembram da aula de física, no segundo grau, que abordou a Teoria dos Vasos Comunicantes? Pois é… Nenhuma das fontes é movida por qualquer bomba ou energia artificial. Elas são alimentadas cada uma em razão do desnível do terreno, utilizando a força da gravidade. Ou seja, até a megalomania do imperador acabou sendo eco friendly. Óbvio que o sistema pode ser inteiro desligado, de forma a não danificar os encanamento e as fontes durante o rigoroso inverno russo.

Convém notar, também, a existência das chamadas “fontes surpresas”. Explicando: são fontes aparentemente “invisíveis” aos passantes e que são sub-repticiamente acionadas, dando um susto – e um bom banho – em quem passar por elas distraído. Atualmente, a graça e loucura dos “malucos” de plantão é de ficar esperando a fonte abrir e correr pelo meio dela se ensopando (detalhe: a temperatura deveria beirar uns 5ºC, não se enganem com o dia ensolarado). Vejam só:

Caminho de Água - fonte surpresa - Peterhof

Caminho de Água – fonte surpresa – Peterhof

Caminho de Água - fonte surpresa - Peterhof

Caminho de Água – fonte surpresa – Peterhof

O Grande Carvalho - Fonte Surpresa - Peterhof

O Grande Carvalho – Fonte Surpresa – Peterhof

Creio que para muitas das pessoas ali, este deva ser o único banho em dias, quiçá, semanas… Eca!

O parque também possui uma linda capela, que aparentemente só abre no verão ou em dias de concerto. No guia do palácio que eu comprei, ela parece ser magnífica, com seu interior ricamente decorado.

Capela - Peterhof

Capela – Peterhof

A parte interna do palácio é absurdamente suntuosa (fotos proibidas, infelizmente). Contrariamente ao que ocorreu com os castelos franceses no pós-Revolução, os bolcheviques ao tomarem o poder em 1917 declararam as antigas residências palacianas da nobreza como museus e consequente propriedade do povo. Desta forma, a decoração, os móveis, os adornos e os enfeites foram todos catalogados e preservados. Ao passo que na França, os revolucionários venderam os pertences dos nobres em leilões e a preço de banana. Por isso que se vê costumeiramente palácios franceses vazios de móveis. A França tem feito um trabalho bastante interessante para a recuperação do mobiliário que guarnecia os imóveis de sua nobreza deposta, que inclui o pagamento de impostos de transmissão através de dação em pagamento com objetos que pertenceram aos nobres e que estão em poder de particulares, a prioridade absoluta do governo na aquisição de objetos franceses em leilões e vendas promovidos dentro do país… Mas isso fica para outro(s) post(s).

Por fim, antes de entrar nos aspectos práticos da visita, acho conveniente informar que o Palácio de Peterhof foi praticamente todo destruído durante a II Guerra Mundial, quando do cerco de Leningrado. Para não dizer que nada ficou de pé, apenas o escritório particular de Pedro I, o Grande, saiu menos chamuscado.

Peterhof - II Guerra Mundial - Chandogin: Dystrophiker, Leningrad, Dezember 1942 (© Deutsch-Russisches Museum Berlin-Karlshorst e.V.) - imagem retirada do site http://www.wartist.org/blog/?p=742

Peterhof – II Guerra Mundial – Chandogin: Dystrophiker, Leningrad, Dezember 1942 (© Deutsch-Russisches Museum Berlin-Karlshorst e.V.) – imagem retirada do site http://www.wartist.org/blog/?p=742

O trabalho de restauração dos russos, realizado por determinação do Stalin, é algo primoroso! Da mesma forma que comentei nesse post que havia ficado um pouco decepcionado com a reconstrução da Casa dos Cabeças Negras, em Riga, o mesmo não se pode dizer dos palácios imperiais russos que foram arrasados na última Grande Guerra. O trabalho de restauração foi (e ainda está sendo) irretocável! Graças à preocupação que os soviéticos tiveram em catalogar e em fotografar o interior e o exterior dos palácios (desgraça parecida sucedeu ao Palácio da Catarina, em Tsarskoe Selo, também na II Guerra), foi possível a sua reconstrução fidedigna. É bem verdade que os móveis e obras de arte foram imediatamente retirados dos museus quando da declaração de guerra à Alemanha; mas ornamentos, decoração de paredes, de teto e do chão, tudo isto foi refeito na maior perfeição, tanto que o visitante não acredita que o palácio não é “original”. Inclusive as estátuas que guarnecem as fontes, todas foram roubadas pelos nazistas, e todas foram refeitas à semelhança das que anteriormente existiam. Eu fiquei encantado e tiro o meu chapéu para os artesãos russos. Nunca vi nada igual nas minhas andanças por aí!

Peterhof na prática

link do subtítulo dá direto acesso ao site do museu. Se vocês forem fazer a viagem independente, sem guia, sugiro que acessem a versão russa do site e façam a tradução pelo Google Chrome, vai sair truncado, mas pelo menos vocês terão a certeza das informações sobre o museu (a versão em inglês não é tão atualizada). O turismo na Rússia não é excepcionalmente bem orientado para o visitante estrangeiro (alguma semelhança com o Brasil?!), pois tudo é voltado mais para o turismo interno (em nosso país, nem isso).

O palácio fica situado numa abastada cidade pertencente à região metropolitana de São Petersburgo, lugar habitado atualmente por milionários. Nas suas imediações está situado, inclusive o Palácio Konstantinovsky (Strelna) que, em sua origem, também foi concebido para o Pedro I, o Grande, pelo arquiteto francês Jean-Baptiste Le Blond. Atualmente ele é a residência do Presidente da Rússia quando em São Petersburgo. O palácio é aberto à visitação quando o entourage presidencial não está na cidade.

Aproveito para prevenir aos interessados, que, após o Hermitage, este é o museu mais visitado da Rússia, e, por óbvio, muito cheio, principalmente nos fins-de-semana. Existe, ainda, uma limitação de ingressos para cada dia. Por conta desse aspecto, apesar de não estar em alta temporada no dia em que visitamos (mas estava bem cheio), nós resolvemos comprar o passeio já aqui do Brasil. A agência Tchayka reservou o passeio para nós com a excelente guia francófila, Marie Krasnitskaya (infelizmente, ela só faz passeios em francês, se for o caso, vocês podem solicitá-la à agência). Ficou mais caro, mas fomos de carro, paramos na porta, entramos pela entrada dos guias, sem fila e sem amolação. Essa decisão vai depender do quanto é importante para vocês conhecerem o palácio. Para mim, estava fora de questão deixar de visitá-lo. Vocês podem tentar comprar diretamente com uma agência russa, nós achamos arriscado, pois nos informaram que os ingressos seriam adquiridos na hora da visita (não sei se eles têm alguma garantia nesse sentido). Nós não nos arriscamos e não nos arrependemos, até porque as conversas com a Marie foram um toque especial em toda a viagem. Ela nos contou uma série de fatos sobre o dia-a-dia na Rússia, impressões que podem ser mais interessantes do que o passeio em si, fora que ela tem um ótimo francês e usa algumas expressões engraçadas…

O chato do passeio com guia é que você fica limitado a um horário pré-estipulado. Não fizemos nada correndo, mas, por exemplo, não deu para passear nos jardins superiores… Fica para a próxima vez!

Outra coisa, já escutei por aí que só vale à pena conhecer os jardins do Peterhof, que o interior do Palácio da Catarina é mais bonito. Balela! Os dois têm interiores lindos. Fazer esse passeio para não conhecer o museu por dentro, na minha singela opinião, é um decisão tristemente equivocada!

Se vocês forem fazer o tour de forma independente, existem 3 opções de transporte ao palácio segundo o Lonely Planet: 1) de barco, com saídas em frente ao Hermitage, no cais do rio Neva, e leva vocês diretamente até o palácio; 2) de Marshrutka (uma espécie de micro-ônibus), as de número 300 e 424, saem da estação de metrô Avtvovo (o metrô de São Petersburgo tem inscrições no alfabeto latino), bastando pedir para o condutor deixar você perto Petergof dvorets, se arriscando ao chauffeur não entender patavina da sua pronúncia (leve um papelzinho escrito, peça ajuda ao seu hotel); 3) ou de trem, partindo da Estação Báltica de São Petersburgo e descendo na estação Novy Petergof (Новый Петергоф); de lá até o palácio é uma caminhada de 20 minutos.

A Camila Navarro foi de barca e, pelo jeito, aprovou o passeio. Na verdade, era o que eu queria ter feito, mas o trajeto de barco só é disponibilizado no verãozão.

Sobre andrerj75

Eu me chamo André. Sou morador do Rio de Janeiro. Desde pequeno, fui acostumado a viajar com os meus pais para países diferentes e a apreciar as mais diversas expressões artísticas e culturais, o que mantive de bom grado já adulto. Também, desde pequeno, ganhei um fascínio pelo estudo de História, que se acirrou à medida que os anos foram passando. Nesse contexto, sou frequentemente abordado por amigos e por conhecidos - às vezes até por pessoas estranhas - pedindo dicas de viagens e solicitando que eu tente organizar pequenos roteiros para ajudá-los em suas férias. Resolvi unir o útil ao agradável e dei início a este blog. Escreverei sobre as minhas viagens na tentativa de passar as minhas impressões sobre os lugares que conheci. Na medida do possível, darei dicas de hotéis, de restaurantes e de lugares para passear. Não tenho qualquer compromisso com a cronologia, escreverei sobre o que der vontade. Agradeço a participação de todos!
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4 respostas para Peterhof – a versão do czar Pedro I, o Grande, para o Palácio de Versailles

  1. Sergio disse:

    Texto excelente, com direito a nomes em russo (tirando onda!) e fotos muito boas! Deu vontade de visitar, ainda mais podemos ir de barco! Valeu!

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  2. Lindo em qualquer época!

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    • andrerj75 disse:

      É o máximo!

      É mais legal do que o Palácio da Catarina, o interior não fica a dever e os jardins são magníficos. Só fiquei com pena de não ter ido de Hydrofoil. O seu blog foi um bom roteiro para a minha visita à cidade.

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